terça-feira, 4 de setembro de 2007

Pra quem pensa que “ORBE” não tem história

“Lágrimas”, “Os jovens guardas”, “Santos de barro”, “Josan III”, “Huailer”; tantos nomes, tantas tentativas de um filho de uma dependente química, alcoólatra, que ficou órfão aos nove anos, de pai ausente desde que se entendeu por pessoa. Aos 14 anos, inquieto, tentando aprender compor música, sem saber sequer tocar instrumento algum e já fazendo versões em português de músicas internacionais, como de Michael Jackson, seu ídolo principal até aquele momento, engenhosamente conseguiu ganhar um violão de um de seus irmãos no seu aniversário de 15 anos, no mesmo ano e mês em que Kurt Cobain suicidou-se. A notícia sinistra o levou a querer entender os motivos pelos quais o músico havia cometido tal ato, sendo fã dos hits mais conhecidos da banda Nirvana e fanático por Guns n’Roses até ouvir unpluggd in New York da banda do suicida, passando assim, na época, ser a banda mais ouvida por Márcio Marques, a pessoa de quem falo no momento.

Dentro de um mês já tocava alguma coisa, pra ser mais exato “Refrão de bolero” da banda brasileira Engenheiros do Hawaii, e também já havia composto a sua primeira música, a propósito, uma música infantil e ridícula cujo título era “Ainda ia dar tempo se não fosse o japonês”, música dedicada a uma “paixãosinha” da escola.

Certa tarde vai a sua casa seu melhor amigo, Nildo Neri, Márcio propõe formarem uma banda de rock, disse Nildo: “sabemos mal tocar, como é que você quer que façamos uma banda, como tocaremos as músicas das outras bandas?” Respondeu Márcio entre outras coisas: “Não precisamos tocar músicas de outras bandas, nós podemos inventar as nossas próprias músicas, ninguém poderá se meter nisso....”.E assim passaram a tocar juntos, pensaram rapidamente em colocar o nome da proposta banda de “lágrimas”, com a entrada de um terceiro integrante, Pile, colocaram o nome da banda de “Os jovens guardas”, passavam tardes de fim de semana ensaiando e ouvindo Beatles, essas coisas aconteciam em final do ano de 94, ano em que também foi composta uma das primeiras músicas significativas de Márcio “Adolescência” música que falava de prostituição, porte de armas e suicídio de adolescentes por imitarem Kurt Cobain.

Não satisfeito com o estilo da banda e querendo colocar pra fora o que não conseguia, saiu dos “Jovens Guardas” convidando Pile para formarem outra banda, pensaram rapidamente em colocar o nome da tal banda de “Santos de barro”, porém com a entrada de uma terceira pessoa, Elivaldo Mojalott, um colega que houvera conhecido na escola, deram o nome à banda de “Josan III”. Márcio começava a encontrar o formato musical através do qual conseguiria expor o que lhe sufocava.

Josan III durou alguns meses, Márcio “deu um tempo” e nesse tempo compôs algumas músicas experimentais, ainda buscando o formato ideal, dentre elas “Na periferia”, música que relatava o assassinato de uma amiga na periferia da cidade pelo ex-namorado, isto é, uma história real. A melhor escola que encontrou na época foi Nirvana, principalmente o álbum “Bleach”.

Por não se haver fixado banda no decorrer desse tempo, não havia sido possível alguma apresentação pública.

Em 1996 Márcio conhece um adolescente, Jr, o qual era seu vizinho e se aproximou de Márcio por dizer ouvir sempre a barulheira de bateria em sua casa e também dizia ter uma banda com dois amigos. Márcio já com segundas intenções, isto é, pensando em convidar pelo menos o baterista e o baixista da tal banda, por estar procurando pessoas que entendessem suas idéias, pediu para que o jovem os apresentassem. Certo dia chega em casa de Márcio, Jr e mais dois adolescentes; um era quase loiro e usava óculos de grau, o outro era moreno claro e tinha os cabelos compridos, o de óculos se chamava Giancarlo, o moreno Jiuliano, eles eram irmão. Márcio mostrou a eles as demos gravadas por Josan III, foi quando também declarou que não pretendia tocar cover por preferir criar suas própias músicas. “Mas nem umazinha?” alguém perguntou e Márcio respondeu: “Não tenho prazer em tocar as músicas dos outros, elas não falam o que eu quero dizer”. Eles quiseram tocar com Márcio, o problema foi quando o mesmo declarou que tinha preferência por trio. Como Gian era no caso o baixista, já estaria dentro, igualmente o baterista. Giancarlo insistiu que deixasse seu irmão tocar segunda guitarra, constrangido seu irmão disse: “O cara já falou que quer um trio e se for me colocar só pra te agradar eu não quero.” Mesmo assim começaram os ensaios na casa de Gian com seu irmão como segunda guitarra, em pouco tempo ele resolveu sair, porém com ressentimentos. Em uma de suas crises estava no quarto chorando com a arma de seu pai, ao lado de uma amiga que o tentava consolar, Márcio querendo conversar com ele entrou no quarto e Jiuliano com a arma apontando para Márcio, falou: “Não chega perto de mim se não eu te dou um tiro” a frase que tempos depois Márcio usaria em uma de suas músicas, a saber “Drogas na escola”.

Por começar uma onda de blasfêmias entre Márcio e Gian, terminou com a saída de Jr que era de família evangélica.Até este tempo a banda se chamava “huailer”, um nome inventado sem significado algum. Com a saída de Jr, Márcio insistiu que Gian assumisse a bateria por é claro, também saber tocar.

Nesta mesma época, Márcio inconformado com o nome da banda sem significado, buscou no dicionário brasileiro um nome que tivesse haver com as letras que eles cantavam e encontrou finalmente “Orbe” que quer dizer: O globo terrestre, esfera, mundo... E por ser inconformado com tanta coisa do mundo e relatar em suas letras coisas que obviamente não pode fugir do orbe, decidiu que este seria definitivamente o nome da banda.


Márcio convidou para tocar contrabaixo um Jovem chamado João. Estava próxima a primeira apresentação da banda Orbe que seria na escola que Gian estudava, e assim aconteceu. Resultado: jovens impressionados com a performance da banda. Foi a única apresentação na qual João tocou, queria mudar muita a ideologia da Orbe.

Pile foi convidado a tocar contrabaixo na banda e aconteceu a segunda apresentação da Orbe num terreno espaçoso usado como campo de futebol, pouquíssimas pessoas no local. Porém havia a ousadia de Márcio gritar com toda a força de seu pulmão “venham todos ver a melhor banda de Porto Velho!”.


Depois da segunda apresentação da Orbe, Pile deixou a banda, Márcio não soube entender sua melancolia.

Giancarlo tinha um outro sonho e foi correr atrás dele: jogar futebol juvenil profissional em São Paulo.
Márcio procurou Mojalott que já havia tocado contrabaixo na formação Josan III, que pode ser considerada o embrião da Orbe. Mojalott apresentou a Márcio um jovem que tocava bateria com uma agressividade como nem um antes, ele se chamava Walter. E com esta formação a Orbe fez sucessivas apresentações em escolas e uma em um ginásio.

Já era por volta do final de 1997, Walter deixa a banda e Elivaldo apresenta um outro rapaz que estava fazendo aulas de bateria, o jovem se chamava Rafael. Por conflitos de opiniões como desde a época da escola, outra vez Márcio afastá-se de Mojalott e nesse tempo Gian liga para Márcio dizendo que estava voltando, pois, segundo ele, era muito melhor tocar na Orbe do que jogar futebol.


Quando Giancarlo voltou, Márcio apresenta a ele Rafael, insistindo desta vez que Gian assumisse o contrabaixo, que era seu instrumento a princípio, pelo fato de Rafael, naquela ocasião, saber apenas tocar bateria.

Foi realizada uma festa na casa de Gian, na qual a banda Orbe seria a atração principal, o nome da festa se chamava “A festa do Gian”. Nesta festa foi realizado um fato inédito na cidade, Márcio despedaça sua guitarra no final da última música da apresentação. Os jovens delirantes se jogavam encima da bateria e do equipamento de som e uma testemunha ocular disse que ouviu um jovem dizer para Márcio que quando formasse uma banda, teria influência da Orbe com certeza.


Márcio com um repertório com mais de 12 músicas, ansiava gravar a primeira obra da orbe, ainda que fosse apenas demonstrativa.

Um certo dia, em 1998, enquanto Márcio procurava encaixar a banda em determinado local onde se realizavam eventos, avistou um rapaz com um violão nas costas, aproximando-se o rapaz, Márcio puxou assunto: “Você está tentando encaixar a sua banda no evento?” respondeu o jovem: “Não, estou aqui para resolver um outro negócio” e Márcio disse:“Bem, foi o que pensei vendo você com esse violão nas costas; você toca bem?” “Um pouco”respondeu o rapaz e começou a tocar algumas músicas da Legião Urbana; depois o jovem perguntou: “E você, tem uma banda?” Márcio respondeu: “Sim, a melhor banda de rock do Brasil.” E o rapaz indagou: “Se é a melhor do Brasil porque é que você não está famoso e fazendo sucesso?” Márcio respondeu: “Porque ainda não tive oportunidade.” perguntou o rapaz: “E como faço pra ouvir ou ver vocês tocando?” Respondeu Márcio: “Vamos marcar”. Eles marcaram o dia e o local e na casa de Gian mostraram a Inaldo uma demo gravada em estúdio da música adolescência, o jovem ficou impressionadíssimo e perguntou se tinha vaga na banda, Márcio respondeu que sim e Gian ficou perplexo e pergintou: “Como assim tem vaga?!” Sem entender a intenção de Márcio, pois em seu pensamento a banda já estava formada por ele, Márcio e Rafael, Márcio disse a Gian: “Depois nós conversamos” se despediram e marcaram novo encontro.

Márcio conversando depois com Gian, explicou que nem ele nem Gian e tampouco Rafael tinham emprego, se, porém, Inaldo entrasse, pelo menos um poderia investir na banda.

Mas pela preferência de trio, entrando Inaldo, alguém teria que sair e naquela ocasião teria que ser Rafael, e assim aconteceu.

Márcio e Gian ensinaram Inaldo a tocar contrabaixo e apesar de Inaldo ser canhoto, não foi tão difícil, e um dos pontos que agradava Márcio com relação a Inaldo era justamente o fato de ele ser sinistro como Kurt e McCartney, era algo que deixaria a Orbe ainda mais especial.

Do ano de 1999 até o final do ano 2000 foram feitas várias apresentações, e Inaldo como havia combinado com Márcio, investiu no primeiro, cd independente da banda, o cd cujo título era “aborto” baseada em parte da ideologia “Orbe” concluída até aquele tempo por Márcio de que “o nascer neste mundo é a morte” o cd não atingia qualidade profissional por falta de estrutura e profissionais em relação a estúdios da cidade, o cd então era um demo de baixa qualidade. Ainda assim Márcio conseguiu colocar uma das músicas numa rádio local, num espaço que tocava rock no período noturno, o estado inteiro que esteve ligado a tal rádio naquele horário, ouviu a música da banda Orbe. No show de lançamento do cd como combinado entre Márcio e Inaldo, o contrabaixo foi incendiado e quebrado na última música da apresentação, levando o público jovem à euforia total. Gian não tocou no lançamento do cd por ter entrado em atrito com Márcio ainda no período das últimas gravações do mesmo. Foi convidado Rafael para o lançamento.

A banda chegou a tocar em um dos lugares mais refinados em que tocava rock na cidade, na época, com direito a cachê e tudo, e foi elogiada pelo baixista da banda “Ossos do ofício” hoje “Nitro”.

A banda “Orbe” parou por causa de envolvimento com drogas. Gian se viciou em droga química e Márcio teve problemas com outras drogas e com álcool. Apesar de tentarem passar uma mensagem positiva em suas músicas, contra as drogas, foram vítimas das mesmas.

Márcio se converteu ao Cristianismo e falando de Jesus Cristo para Gian, o ajudou em sua conversão. Tendo também se convertido ao Cristianismo, Gian foi morar com sua mãe que vivia fora do país.

Passado sete anos, hoje Giancarlo está terminando teologia nos Estados Unidos e Márcio Marques convidando Elivaldo Mojalott e Rafael voltou com a banda Orbe e com um pensamento diferente de mundo. Ele diz: “Deus não tem culpa de nossos erros nem dos erros de nossos pais”.


Por João Frija Calimase em 22 de agosto de 2007